Indicação da Clarice Maia Scotti, minha sobrinha, conheci Mariana Enriquez pelo livro de contos As Coisas que Perdemos no Fogo (Intrínseca). Confesso que senti de cara afinidades com essa argentina, por ser, como eu, jornalista e escritora. Mas pararam por aí nossas coisas em comum, porque estou pra ver uma literatura mais dura e dolorosa do que a dela. Chegava a parar de ler, certas noites, esperando a dor passar.
As personagens dos contos de Mariana são mulheres mais novas que eu, que vivem uma vida nas periferias de Buenos Aires, entre drogas, drogados, pedintes, traficantes, violência urbana, falta de perspectiva de todo tipo. E há ainda mistérios, suspense, narrativas que tragam o leitor para um universo habitado por fantasmas reais ou imaginários. Nada fácil, mas tudo colocado de maneira tão crua que dá pra acreditar e morrer de medo.
A desagregação das personagens ocorre tanto no plano físico quanto no mental e no emocional. O sofrimento do indivíduo acompanha os momentos pesados de uma Argentina pós-ditadura, aquele período em torno da guerra das Malvinas, em que o povo e o país ainda tateavam em busca de uma identidade recentemente estilhaçada pelos desgovernos. Povo, país, pessoas, vítimas do obscurantismo que só gera vazio e desesperança. Muito muito duro.
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