A viagem a Sergipe tinha o claro objetivo de me permitir descansar ao lado das amigas, mas, também, de visitar a cidade de Estância, de onde saiu meu bisavô Antônio Ribeiro Pacheco d’Ávila. Sabia disso pelo livro da minha avó, Maria da Glória d’Ávila Arreguy, de quem estamos lançando pela Outubro a terceira edição do livro “Antes que toque a meia-noite – memórias de uma professora”.

O pouco que sabemos sobre o antepassado está no livro de sua filha. Que era juiz de paz. Que empreendeu verdadeiro périplo por cidades do interior de Minas, como Pouso Alto, onde se casou com minha bisavó. Que morava em Minas Novas quando vovó nasceu, em 1895. Que foram parar em Caratinga, onde os Ávilas encontraram os Arreguys e em sua descendência chegamos nós. Que toda essa circulação de comarca em comarca se devia aos problemas políticos que um juiz sério enfrentava diante dos poderosos de cada local. Que, conscientemente, como informa minha avó em seu livro, nunca cometeu uma injustiça.

Esse legado de um homem justo há muito me empurrava para Estância. Não pude passar por lá da primeira vez que fui a Sergipe, porque viajávamos de bicicleta e um “pequeno” desvio de 30 ou 40 quilômetros, de bike, mudaria toda a história e não nos permitiria chegar a Mangue Seco, como planejado.

Desta vez seria diferente. Pois estávamos de carro e com tempo. E o principal: eu contava com a cumplicidade das minhas amadas e lindas amigas, Mada, Lísia e Gegena, que toparam o programa incerto de passear por uma cidade sem muita referência para elas.

Numa manhã chuvosa do final de janeiro, então, trocamos o rio, a praia e a piscina por um tour em Estância, à procura dos Ávilas que, eu acreditava, haveria em profusão no lugar. Tinha a desconfiança de que buscava mais literatura do que história. Suspeitas que se confirmaram.

Os amigos do condomínio já haviam confirmado que havia mesmo essa família em Estância, inclusive uma das queridas que conhecemos, Karine, mulher do gaúcho Jorge, que tem d’Ávila no nome. Todo mundo era sabedor de que Estância era terra dessa família e dos Amados. Sim, Jorge Amado, embora nascido em Itabuna, tinha raízes por lá. Seu pai nasceu na cidade. E outro importante intelectual, Gilberto Amado, também. Ricardão, um dos personagens que conhecemos em Itaporanga, foi aluno de duas professoras da família Amado. E vai por aí afora…

Bom, chegando ao centro histórico de Estância, o que pretendia eu? Encontrar talvez uma menção ao sobrenome numa placa de rua, numa praça ou num busto? Sim. Em vão. Circulamos por um tempo, entramos em templos, apreciamos jardins e coretos, mas nada de Ávila ou d’Ávila em canto algum. Uma clínica cheia de nomes de doutores na fachada – entre eles algum parente? Nenhum.

A referência mais interessante que encontrei foi um casarão histórico tombado, onde nasceu Gilberto Amado e que hoje é sede da Lira Carlos Gomes. Conhecia nada sobre esse autor de vasta memorialística, mas como nunca deixei de ser jornalista, corri a pesquisar, pra pelo menos fingir pras amigas que eu sabia mais do que sabia. E descubro, então, que o célebre intelectual, além de escritor, era também político, foi deputado, e havia matado a tiros um homem, o poeta Aníbal Teófilo, por desentendimentos na saída de um evento literário. E mais: alegando privação momentânea dos sentidos, foi absolvido do crime pelo júri! Isso ele não conta em seus livros de memórias.

Pra compensar a decepção com o conterrâneo do meu bisavô, encontrei uma igreja construída pela irmandade dos pretos de Estância, bem conservada e com direito a placa e respeito. Gostei.

A circulação pelo centro histórico não rendeu muito mais que isso. A feira da cidade, naquele dia, não funcionava. Mais não havia para ver.

Não sei se o juiz de paz Antônio Ribeiro Pacheco d’Ávila um dia voltou à sua terra natal. Se o fizesse hoje, veria uma cidade polo do sul do estado, às margens da BR 101 em trecho duplicado, próxima à Bahia, caminho para incríveis destinos turísticos, sejam baianos ou sergipanos. Um belo nome, lembranças dos que se foram, mais inspiração para devaneios oníricos do que para uma história com agá maiúsculo.

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