Comprei o livro Como dialogar com um negacionista, da Elika Takimoto (LF Editorial), pensando que seria uma peça de militância no atual cenário obscurantista. É que sigo essa filósofa e professora de física no Twitter, e acompanho sua atuação política, fundamental nestes tempos. Mas, pra minha surpresa, o livro vai bem além de uma peça do que antigamente chamávamos “agit prop” (agitação e propaganda).
Trata-se de uma defesa profunda da ciência, ou melhor, das ciências, como ela explica ao longo dos capítulos. Primeiro, porque não há uma ciência única. Inclusive as ciências humanas costumam ser esquecidas até por defensores da “ciência”. Segundo, porque as ciências não são dicotômicas, não são taxativas, mas investigativas, abertas necessariamente ao questionamento, à dúvida, pra poderem evoluir e superar conceitos ultrapassados e erros históricos.
Elika Takimoto explica que o negacionismo não é “privilégio” dos que hoje negam, por exemplo, a vacina, o distanciamento social ou o uso das máscaras. Sujeitos que somos aos fatores psicológicos, muitos de nós nos negamos a ver, por exemplo, as consequências da criação de gado extensivo em todo o mundo sobre o aquecimento global, ainda que isso esteja comprovado cientificamente. Muitos fingem não ver, ou preferem se apegar a outros argumentos, possíveis, sim, mas sem a força das evidências da tese oposta.
Galileu Galilei é um dos cientistas mais citados por Elika no livro. E mesmo ele, que abriu tantos caminhos para a física, foi negacionista quando Kepler tentava lhe mostrar que as órbitas da Terra e dos demais planetas do sistema solar eram elípticas, e não circulares, como pensava o italiano, defensor do círculo como a forma perfeita.
Assim, com explanações sobre história e filosofia das ciências, que não são neutras e, ao contrário, sempre foram feitas por sujeitos e interesses, a escritora chega ao ponto em questão: dialogar requer ouvir. Abrir-se à troca. Nada de despejar certezas sem disposição para uma possível troca, um movimento de mão dupla. Não é fácil na atual conjuntura, mas possível e fundamental.
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