Depois de visitar episódios bíblicos, reinventando versões muito pessoais para personagens conhecidas de todos, o escritor gaúcho Moacyr Scliar revisita, em Eu vos abraço, milhões, um momento histórico brasileiro e cria um personagem com um quê de Forrest Gump. Valdo. um gaúcho de 15 anos, descobre o comunismo pelas mãos de um amigo, que logo morre e lhe deixa de herança a missão de encontrar o líder do PC, Astrojildo Pereira, para formalizar sua entrada no Partido.
Em 1929, Valdo parte para o Rio de Janeiro e, tal qual o personagem que consagrou Tom Hanks no cinema, esbarra em situações como a construção do Cristo Redentor, as manifestações anarquistas, a Revolução de 30, os gaúchos amarrando os cavalos ao Obelisco…
Enquanto Valdo pesquisa o modo de ver e pensar que tanto o atrai, testando a dialética e outras estruturas da esquerda, a vida lhe apronta surpresas, encontros, descobertas e decepções. Com ele, a ideologia marxista passeia, com seus avanços e contradições, junto ao andamento da história do Brasil, num momento de virada rumo à modernidade.
Scliar não idealiza nem demoniza a política, a religião, os amores e sonhos de uma geração. Ele os descreve com simpatia, com empatia, mas sem julgamentos. Os fatos narrados por um avô ao jovem neto não resvalam para o rancor nem para a nostalgia. Assim foi a vida, que bom que a vida foi assim.
Em Eu vos abraço, milhões, Scliar prende e entretém com o domínio dos craques do romance. Sua inteligência, erudição e bom humor lhe dão a nota certa de simplicidade dos grandes. Que leitura prazerosa!

Beijus!