O terceiro livro que quero comentar, também de amigo de Brasília, é o romance
“Noites Simultâneas” (Bagaço), de Maurício Melo Júnior, igualmente ambientado durante a ditadura militar. Maurício levou alguns anos a compor essa história, chegou a interromper sua escrita, mas por fim, e felizmente, voltou a trabalhar nela até entregar ao leitor essa belezura.
Um homem sem nome conduz a narrativa, que começa nos agitados anos 1960. Ele é um filho de fazendeiro que renega a origem de elite para adotar a ideologia de tantos estudantes da época, que queriam mudar o mundo, fazer a revolução, derrubar a ditadura que se instalara recentemente e enfrentar a repressão de peito aberto, sem medo do alto custo de todo esse heroísmo.
O rapaz, após se integrar a um grupo político, vai para a clandestinidade, defende a luta armada e se entrega a ela, até ser preso e torturado, o que mudará radicalmente sua trajetória. O título original do romance, “Medo”, define a segunda parte da história desse rapaz, que escolhe a sobrevivência e a fuga do martírio, também a um alto custo.
Na sua trajetória esse rapaz amou uma moça, militante como ele, mas com destinos desencontrados. Ele muda de vida, mas não a perde de vista, e nunca consegue voltar a amar, a viver a tranquilidade de um sentimento verdadeiro. Vem para Brasília, passa pela vida com relativa rapidez, enquanto convive com os fantasmas e tormentos dos quais se torna inseparável.
Mais que a temática, importante, atual e necessária, é na escrita de Maurício Melo que residem suas melhores qualidades. O escritor é daqueles que trabalham a palavra, a frase, a substância do texto. Por isso os anos debruçados sobre a construção de seu primeiro romance adulto. Porque tudo é tecido com cuidado, delicadeza, perfeição. O resultado disso é sentimento, emoção que prende o leitor e o conquista visceralmente.
Beijinhos!
Posts recomendadosVer Todos
A descoberta do Brasil e outros deslocamentos
Delicada e forte carpintaria literária
Diferentes emoções numa impressionante coleção de contos
Silêncio! Precisamos ouvir o canto da iara
Nas alturas escarpadas da estética
Falta de pensamento e de contato com a realidade, e a canalhice de sempre