Meu pai e minha mãe sempre olharam para aquele volume de Judas, o obscuro na sua estante dizendo ser um dos romances prediletos deles, um clássico, uma beleza. Eu não sabia do que se tratava, pensava que fosse algo bíblico e, com preguiça de suas 500 páginas, adiava um encontro. Até que resolvi encarar a obra-prima de Thomas Hardy, britânico do século XIX, e passei algumas semanas com ele.

Muitas coisas aconteceram então. O livro é realmente um primor da literatura clássica da época, com um herói e uma heroína trágicos, condenados ao fracasso e às desventuras por um destino implacável e por uma moral cruel. Judas Fawley e Sue Bridehead são os primos que vão e vêm em seu amor ora platônico, ora realizado, mas nunca plenamente. Um homem de ambições intelectuais rejeitado pela sociedade culta por sua pobreza, uma mulher de ideias avançadas e depois marcada pela culpa diante de fatos trágicos, uma sociedade hipócrita, quantos elementos traz o romance!

Pesquisando sobre Hardy, de quem nada sabia, descobri que foi tão criticado quando do lançamento do livro que desistiu de escrever e capitulou diante da incompreensão. Descobri também que este é o romance da vida de muita gente – além de meu pai e minha mãe. Descobri que há uma reedição mais recente, da Geração.

E olhem o que aconteceu com o meu livro (meu não, o que surrupiei da estante da minha mãe): era tão velho que, nas minhas andanças e leituras em ônibus, tomou um pouco de chuva, despencou todo, perdeu uma página, e agora aguarda, num envelope, que eu consiga restaurá-lo. Soube de alguém que poderá fazer isso por mim – por ele, pela literatura universal – em BH. Em breve, Judas, o obscuro deixará a obscuridade do envelope onde repousa, para voltar a ser lido. Sem a página que falta.

Beijos!