No meu tempo de jovem, quando imperava o arbítrio da ditadura militar, era comum a esquerda considerar futebol coisa de alienado, ópio do povo etc. Não pra mim. Futebol sempre foi expressão cultural da alma do povo, e o jogo, em si, metáfora da vida aqui fora. Histórias e personagens como Reinaldo me emocionavam por todos os aspectos envolvidos: pela genialidade de seu futebol, pela tragicidade de sua história pessoal, pela humanidade expressa em seu olhar de menino frágil, menino rei.
Esse menino hoje completa 60 anos e, em mais uma coincidência que me une ao ídolo, acabo de ler a biografia dele escrita por seu filho Philipe Van R. Lima. “Punho cerrado – A história do Rei” (Letramento) me transportou de volta aos melhores anos da minha “atleticanidade” e aos piores pesadelos dessa mesma frequência de paixão que me habita por completo. Eu estava presente ao Mineirão nos principais momentos gloriosos da trajetória do maior artilheiro do Galo. Eu vi, sorvi e gozei cada drible, cada gol, cada explosão do gênio criador. Mas estava também em cada decepção, em cada injustiça, em cada queda sofrida por ele e, com ele, por toda a nação atleticana.
Reinaldo faz parte da minha vida de torcedora e de jornalista. Ainda na faculdade, uma das primeiras – e melhores – entrevistas que fiz foi com ele, pro jornal da faculdade, em companhia de dois grandes amigos desde aquela época, final dos anos 1970. Luciana Gontijo e André de Proença, o Deco da Galonheiros. Por horas conversamos com o Rei em seu escritório na Savassi. Sobre politica, como todos queriam que falássemos, mas muito sobre futebol, tática, técnica, seleção brasileira, colegas de profissão, ídolos, etc.
Depois, ao longo dos anos, com o fim da carreira de jogador, Reinaldo se tornou figura pública na noite e na política de BH, por onde eu também circulava. Toda vez que o encontrava, eu implorava que ele produzisse logo um DVD com seus gols e jogadas. Ele dizia que estava quase pronto. Eu tive o meu, que fiz a besteira de emprestar, fiquei sem. Agora só vejo no Youtube. Mas vejo e revejo tudo, sempre.
Sonhava em escrever eu mesma a biografia do Rei, mas admito que Philipe o fez com propriedade, sem condescendência com nada nem ninguém. O céu e o inferno estão presentes ali, de corpo inteiro. Revivi os maiores sonhos e os piores pesadelos ao sabor do texto fluido do livro. Reencontrei tempos e ídolos. Mas o livro serve com a mesma força para torcedores de outros clubes, para amantes de futebol.
Nesses 60 anos do Rei, deixo meu carinho maior para ele, inspiração de vida e paixão eterna, e para a Massa atleticana da qual tanto me orgulho de fazer parte. Leiam o livro!
Beijos!
legenda da foto: Reinaldo com o livro Belo Horizonte FC, no qual foi publicado meu conto Chico Paquequer, que presta homenagem ao Rei
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